terça-feira, 13 de dezembro de 2011

Comunicador estratégico


Márcia Neri - Correio Braziliense

12/12/2011 12:11

Com oportunidades de emprego tanto na área pública quanto na privada, além do terceiro setor, esse profissional cuida de ações de comunicação para organizações ou personalidades
Carlos Moura/CB/D.A Press
Devemos ter contato direto com o setor administrativo, o RH, todos os segmentos de uma organização. É isso que garante subsídios para trabalharmos bem a imagem do cliente Flávio Schimidt, em entrevista à formanda Renata Delmara
 
Criatividade, dinamismo, habilidade para lidar com grupos sociais diversos e capacidade de tomar decisões com rapidez são características desejáveis a um relações públicas. Também conhecido como RP, esse profissional é responsável por delinear, executar e avaliar ações estratégicas de comunicação para os clientes, sejam eles organizações ou personalidades do mundo político, esportivo ou artístico. Embora a profissão tenha sido regulamentada em meados da década de 1960 (Lei nº 5.377/67 e Decreto-Lei nº 860/69), há registros de que ela é exercida desde o início do século passado no Brasil. Ainda assim, existe uma certa confusão no ar. Em geral, a designação relações públicas soa familiar às pessoas, mas nem todas entendem exatamente o papel desse comunicador. O incômodo é sentido por estudantes, recém-formados e profissionais já experientes.

Para esclarecer as questões que rondam o universo de um RP, a universitária Renata Delmara conversou com Flávio Schimidt, presidente do Conselho Federal de Profissionais de Relações Públicas (Conferp). No encontro, a estudante, que está no último semestre do curso na Faculdade Anhanguera, ouviu de Flávio que a demanda pela profissão tem crescido nos últimos anos. Com a boa situação do Brasil no cenário econômico mundial, as perspectivas são as melhores possíveis.

Schimidt tem mais de 26 anos de experiência em comunicação social. Ele lembrou que os avanços em relação às leis de defesa do consumidor exigem investimento das empresas, que querem fortalecer a imagem perante o público, além de ganhar mercado. “A globalização gerou o aumento da procura por profissionais especialistas em relacionamentos. Podemos atuar tanto no governo quanto na iniciativa privada e no terceiro setor”, apontou. Flávio tem amplo conhecimento e experiência em comunicação interna, prevenção e administração de riscos e crises corporativas, pesquisa de imagem e relações governamentais. Quanto ao retorno financeiro da profissão, o presidente do Conferp garante que existe progresso de acordo com a experiência de cada um: “Não temos um piso salarial definido, mas a remuneração dos recém-formados varia de R$ 1,5 mil a R$ 2 mil. Depois de três anos no mercado, dependendo da evolução do RP, o salário pode ser bem convidativo, ultrapassando os R$ 8 mil. Um diretor da área ganha entre
R$ 15 mil e R$ 30 mil”.

Renata — O que faz um relações públicas?

Flávio — Somos responsáveis pela comunicação organizacional, seja ela interna ou externa, das empresas e instituições. Atuamos para formar e fortalecer a imagem de pessoas físicas também, tais como lideranças, empresários, esportistas, políticos. Nosso papel é sempre encontrar meios para consolidar uma posição do cliente em relação ao público que o cerca.

Renata — Que meios seriam esses?

Flávio — Devemos estar aptos a trabalhar a comunicação da organização, o que pode ser feito de forma global ou segmentada. Realizamos pesquisas de opinião pública, promovemos divulgação jornalística, elaboramos veículos internos, como boletins e vídeos institucionais. Somos ainda responsáveis por organizar a estrutura geral de eventos, redigimos e coordenamos cerimoniais e protocolos, intermediamos a criação de campanhas mercadológicas e administramos a interface com o consumidor final, entre outras coisas.

Renata — Qual é o perfil ideal desse profissional?

Flávio — É muito importante ter boa formação universitária porque isso facilita a aquisição de uma visão organizacional ampla. Também é fundamental se relacionar bem com colegas de outras áreas da comunicação, ou seja, saber lidar e trabalhar com jornalistas, profissionais de marketing e de assessoria de imprensa. Hoje, esses campos parecem estar misturados, mas, na verdade, o RP faz uma interface com eles. Devemos transitar e ter contato direto com o setor administrativo, o RH e todos os segmentos de uma organização. É isso que garante subsídios para trabalharmos bem a imagem do cliente.

Renata — Onde o RP pode atuar?

Flávio — Tanto em microempresas quanto em multinacionais de qualquer segmento. O RP tem formação organizacional, administrativa e política, e pode atuar onde há necessidade de comunicação — na rede hoteleira, no segmento industrial, nas áreas de turismo, de serviços e até na política. Em Brasília, pode-se atuar com parlamentares, lideranças e órgãos públicos. Aos poucos, os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário estão se conscientizando da importância dos RPs, disponibilizando vagas nos concursos para nossos profissionais.

Renata — É mais comum as agências de relações públicas serem contratadas pelas empresas privadas do que as organizações montarem sua própria equipe de RPs?

Flávio — Sem dúvida. No contexto econômico dos últimos anos, cujo quadro de pessoal é sempre enxuto, a operacionalização do trabalho geralmente é feita pelas agências. Algumas organizações têm equipes grandes e próprias, mas, ainda assim, como as agências se especializaram, são contratadas com frequência para trabalhos eventuais ou como terceirizadas para determinadas funções. Comunicação interna, relações governamentais, relacionamento com o cliente, solução de crises e publicação são áreas nas quais podemos atuar.

Renata — Qual é a área de atuação mais promissora?
Flávio — Vivemos um ótimo momento. No passado, nosso trabalho era feito por profissionais de outras áreas, mas o mercado percebeu que o RP estuda os relacionamentos a fundo e está valorizando essa habilidade cada dia mais. Podemos nos especializar dentro de um, dois ou mais segmentos da nossa profissão. Acho a comunicação interna muito atraente para quem está começando; a área de responsabilidade social e sustentabilidade também é. O recém-formado pode escolher uma e se aperfeiçoar. Ao longo da carreira, vai partindo para novos desafios. Sempre digo que o mais importante é não se limitar, não perder a visão global e estratégica que o RP deve ter.

Renata — Com os grandes eventos esportivos que o país sediará nos próximos anos, o RP pode ter mais oportunidades?

Flávio — O nicho esportivo é fantástico. A Copa do Mundo de futebol trará boas oportunidades. Não apenas pelos jogos, mas pelo próprio clima e planejamento que o evento envolve, assim como as Olimpíadas.

Renata — Que tipo de complemento pode contribuir para a formação de estudantes e de profissionais que já estão no mercado?

Flávio — É fundamental buscar cursos complementares para aprimorar o conhecimento. Eu me especializei em pesquisa e auditoria de opinião, comunicação interna e administração de crises. Quando um cliente demanda outros serviços, chamo parceiros para atuarem comigo. O RP deve estudar sempre, mesmo que seja por conta própria. É importante investir em livros e conhecimentos gerais relacionados à comunicação. Especialização e MBAs são fundamentais para o bom profissional. Hoje, as empresas consideram esses títulos praticamente obrigatórios quando selecionam alguém.

Renata — Qual é o maior desafio dessa profissão atualmente?

Flávio — São muitos, mas o maior é acreditar no trabalho que podemos realizar. A maioria dos RPs ocupa níveis gerenciais. Para chegar mais longe, é preciso ter bagagem, estudar sempre e estar a par das mudanças do mundo, ou seja, estar atualizado.

Renata — Ainda existe o estigma de que o RP não é valorizado?

Flávio — Eu acho que não somos conhecidos. Muitos empresários não sabem o que fazemos. Quando precisam de um relações públicas, nem sempre sabem que existe um profissional que estudou e atua para fazer esse tipo de comunicação. O Conferp está trabalhando para que os RPs sejam mais reconhecidos.

Renata — O relações públicas precisou adquirir uma nova postura diante das recentes tecnologias que são usadas também pela comunicação?

Flávio — Sem dúvida. Na verdade, acho que ainda estamos aprendendo a lidar com as redes sociais. Elas trouxeram uma dinâmica impressionante, mas ainda estamos treinando usá-las de maneira eficaz. Jornalistas, assessores de imprensa e publicitários também estão aprendendo. Hoje, mais divulgamos informações do que cuidamos efetivamente da imagem do cliente por meio desse tipo de comunicação. Ainda há muito a se aprender com essa e outras tecnologias.

Renata — Você acredita que optou pela profissão certa?


Flávio — Sim. Não me arrependo. Fiz um bom estágio e procurei trabalhar com profissionais que eram referência no país. Fui assistente de dois RPs muito gabaritados no Brasil e isso me deu conhecimento e segurança para atuar em uma holding e em uma agência internacional antes de abrir minha própria empresa.

Renata — Quantos profissionais existem no país?

Flávio — Acredito que formados há mais de 50 mil. Registrados no Conferp existem cerca de 9 mil.

Renata — Você lançou um livro este ano. Do que se trata?

Flávio — No decorrer da minha carreira, contribuí com capítulos para algumas publicações e passei a ter o hábito de produzir artigos que foram publicados na internet. No livro Do Ponto de Vista de Relações Públicas – razões muito mais fortes para você atuar no ambiente da comunicação, conto a minha experiência como profissional, o que testemunhei nos últimos anos e como os fatos foram trabalhados pelos RPs. O livro aborda os principais acontecimentos desde 1990, como o início da globalização e a internacionalização dos mercados, a globalização da comunicação, as mudanças econômicas, políticas, as eleições no Brasil na era Lula, o ataque terrorista às Torres Gêmeas e muito mais.

Perfis

Nome
Renata Delmara
Idade
33 anos

O que faz
Cursa o último semestre de relações públicas na Faculdade Anhanguera. É bolsista do Programa Universidade para Todos (ProUni) e estagiária no Ministério Público Militar (MPM).

Nome
Flávio Schimidt
Idade
59 anos

O que faz
Formado em comunicação social com habilitação em relações públicas, atua há 26 anos na profissão. Trabalhou para grandes empresas nacionais e multinacionais, foi professor universitário e hoje é proprietário de uma agência/consultoria. Schimidt é presidente do Conselho Federal de Profissionais de Relações Públicas (Conferp).